sexta-feira, 31 de julho de 2015

Resumo Expandido: Artesão de Miriti, Habitué dos sonhos: praxeologia do processo de criação dos Brinquedos de Miriti de Abaetetuba, Pará

Abaixo, compartilho com vocês o resumo expandido que escrevi, junto com o Prof. Silvio Lima Figueiredo, e que foi publicado nos anais do I Seminário Internacional Sociedade e Cultura na PanAmazônia - I SISCultura, GT01 - Expressões culturais e identidades na Amazônia contemporânea, realizado na cidade de Manaus (AM) entre os dia 14 a 17 de outubro de 2014.
Uma primeira versão completa deste resumo expandido foi apresentada no GT21 - Sociedade, trabalho e cidades de fronteira, do II Seminário Internacional Sociedade e Fronteiras/4º Encontro Norte da Sociedade Brasileira de Sociologia 4SBSNORTE/II Semana de Humanidades: Fronteiras contemporâneas: desenvolvimento, conflitos e sociabilidades nas Amazônias, ocorrido na cidade de Boa Vista (RR), entre os dias 11 e 14 de novembro de 2014, com o título Temporalidade lúdica e contemplação estética no trabalho do artesão de miriti, habitué dos sonhos. Em breve disponibilizo esta versão completa.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

O Patrimônio como letra morta


No último domingo (28/06/15), o jornal Diário do Pará publicou, em duas páginas, a matéria intitulada Digno de ser patrimônio? (foto). Na matéria, as autoras falam sobre o caso da proposição do deputado estadual Antônio Furlan (PTB-AP) de registrar o ritmo musical conhecido como melody como patrimônio cultural imaterial do estado do Amapá. Também falam sobre o registro do Círio de Nazaré como patrimônio cultural imaterial do município de Belém, destacando, nesse caso, a retirada da Festa da Chiquita do contexto dessa manifestação; e sobre o processo de registro dos Pássaros Juninos.
Diário do Pará, 28/06/15 (domingo), caderno Você, p. 4-5.
No mesmo dia, enviei um e-mail ao Diário com intuito de apresentar alguns fatos que devem ser considerados quando se refere ao tema do reconhecimento e registro de patrimônio cultural imaterial aqui no Pará. No entanto, e até a presente data, não recebi nenhum retorno do veículo de mídia indigitado, sequer resposta ao meu e-mail. Com isso, sou levado a acreditar que o jornal dos Barbalho, mais uma vez, pouco se importa para o que realmente está inserido nas questões que suscita em suas matérias, utilizando-as, quase sempre, somente para os seus desígnios políticos-eleitorais, afinal, parece-nos que basta-lhes inflar uma pretensa opinião pública contra seus adversários políticos, criticando-lhes os mesmos atos que, quando entronizados nas instituições governamentais, repetem. Mais uma vez, o Diário demonstra, assim como os periódicos do grupo de comunicação e família adversários, ser panfleto político travestido de jornal.

Abaixo, eis a tragédia. Desfrute-a (ou não).

Com farinha e sem açúcar,


***

Após ler a matéria Digno de ser patrimônio?, de Monique Malcher e Aline Monteiro, e publicada ontem (28/06/15), neste jornal, considerei importante acrescentar alguns pontos ao debate. Inicialmente, tangencio a polêmica em torno da proposta do deputado estadual Antônio Furlan (PTB-AP) de que o ritmo musical denominado como melody torne-se patrimônio cultural imaterial do Estado do Amapá. Faço isso para falar detidamente sobre a questão desse tipo de patrimônio aqui no Pará, o que nos ajudará a buscar o fio da meada para entender esse caso aparentemente cômico que ocorre no Estado vizinho ao nosso.
O termo patrimônio cultural integra, inicialmente, o léxico político e, posteriormente, administrativo. Daí falar-se primeiramente em reconhecimento e, depois, em registro do bem como patrimônio cultural – seja material ou imaterial –, o que implica que, após a execução de tais atos administrativos, evidenciar-se-á ainda mais o dever que o Estado possui com a preservação e continuidade de tal bem. Sendo um discurso, o patrimônio cultural, assim como a tradição – este outro termo estando intimamente ligado àquele –, é inventado social e politicamente, e nessa invenção pública, o verbo dever oculta-se no substantivo compromisso que marca o discurso do Estado.
Se discursivamente o ato de reconhecer e registrar um bem como patrimônio cultural constitui uma opção em inseri-lo na pauta de prioridades do Estado, a fim de salvaguardá-lo, devem-se ter, para ir além do discurso, mecanismos legais suficientes para e capazes de permitir tal transição. Aliás, não devemos somente tê-los, como devemos utilizá-los, e, no caso do Pará, esta é nossa debilidade.
Realizando-se um breve levantamento cronológico, chegaremos ao seguinte quadro: (1) em 1989, o artigo 286 da Constituição do Estado do Pará define os bens que compõem o patrimônio cultural paraense, já os dividindo em material e imaterial, embora sem especificar cada um dos termos, e estabelece as seis categorias que o compõem e as formas como o Estado, “com a colaboração da comunidade”, promoverá e protegerá cada bem: “por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento, desapropriação e outras formas de acautelamento e preservação”; (2) no ano seguinte, a Lei n.º 5.629/1990 dispõe sobre a preservação e proteção do que chama de Patrimônio Histórico, Artístico, Natural e Cultural do Estado do Pará, estabelecendo os quatro Livros de Tombo ou de Registro de Bens Culturais, que estariam sob responsabilidade do Departamento Histórico, Artístico e Cultural da Secretaria de Estado de Cultura (DPHAC/Secult) e dos Agentes Municipais de Preservação e Proteção do Patrimônio Cultural (AMPPPC); (3) em agosto de 2009, o Decreto n.º 1.852/2009 “institui o registro dos bens culturais de natureza imaterial que constituem patrimônio cultural imaterial paraense” e “cria o Programa Estadual do Patrimônio Imaterial”; (4) em novembro deste mesmo ano, a Portaria n.º 779/2009 institui normas complementares ao Decreto n.º 1.852/2009, determinando os procedimentos que deverão ser observados para a instauração e instrução do processo administrativo de Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial, e deixando explícita a responsabilidade do Poder Executivo, através do DPHAC/Secult, na instrução técnica de tal processo administrativo; (5) em outubro de 2010, o Decreto n.º 2.558/2010 institui o Inventário do Patrimônio Cultural do Estado do Pará (IPCPA), “uma metodologia de pesquisa com a finalidade de produzir informações pormenorizadas sobre bens de natureza material e imaterial, de maneira a contribuir para o conhecimento, a salvaguarda e a divulgação do Patrimônio Cultural do Estado do Pará”; (6) e no mês seguinte, a Instrução Normativa n.º 001/2010 irá dispor sobre os meios necessários para que os interessados obtenham autorização para o uso da metodologia do IPCPA.
Note-se que, declinando-se por ora em avaliar o teor de tais dispositivos de reconhecimento e registro de bens como patrimônio cultural imaterial do Pará, há uma visível evolução no assunto, com estabelecimento de uma metodologia própria e de uma instrução que normatiza o uso de tal metodologia, embora, se formos mais um pouco na análise, perceba-se a repetição quase que integral do teor da legislação federal (Decreto n.º 3.551/2000; Manual de Aplicação do Inventário de Referências Culturais; Resolução n.º 001/2006 – Iphan; Instrução Normativa n.º 001/2009 – Iphan) trocando-se somente os termos que designem as esferas de poder e de atuação.
No entanto, e apesar da constatação de que tal repetição demonstra o tratamento essencialmente burocrático da questão, o que desejo destacar é que, apesar da existência de tais mecanismos, ainda hoje o que se vê é o processo de reconhecimento e registro de bens como patrimônio cultural imaterial sendo realizado por meio de projetos de lei propostos por deputados estaduais e apreciados pela Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), para posterior sanção do Governador do Estado.
Cito como exemplos de tal prática os três últimos bens registrados como patrimônio cultural imaterial do Estado do Pará, todos originários de projetos de lei aprovados na Alepa: o Festival de Integração Nordestina, realizado no município de Mojuí dos Campos, reconhecido através da Lei n.º 8.175, de 1.º de junho de 2015, a partir do Projeto de Lei n.º 71/2014, de autoria do deputado José Megale (PSDB); o Cacau Fest, realizado no município de Medicilândia, reconhecido através da Lei n.º 8.160, de 09 de abril de 2015, a partir do Projeto de Lei n.º 189/2011, de autoria do deputado Ozório Juvenil (PMDB); e o Festival Jacaré Verão, realizado no município de Jacareacanga, reconhecido através da Lei n.º 8.161, de 09 de abril de 2015, a partir do Projeto de Lei n.º 116/2014, de autoria do deputado Airton Faleiro (PT).
Não entro na discussão (e na polêmica) sobre o merecimento do reconhecimento destes e dos outros bens registrados via tal prática, e destaco mais do que o não cumprimento da legislação por vários agentes públicos. Os procedimentos técnicos necessários e definidos para tais registros não são seguidos e, apesar de tais projetos de lei tramitarem em algumas comissões da Alepa – fato grave, pois demonstra que os deputados, cuja responsabilidade primordial está ligada às leis estaduais, ignoram, de forma deliberada ou não, a legislação em vigor –, pouco se sabe sobre o estado em que se encontrava cada um dos bens que foi registrado, o que é de fundamental importância para conhecermos as condições em que se deu esse registro e, mais ainda, para que posteriormente sejam delineadas políticas e ações de salvaguarda, afinal, esta não é a finalidade do registro?
Em relação à Alepa, causa-me estranhamento que o site da própria instituição informe que o tema [votação do Projeto de Lei n.º n.º 71/2014] levantou a questão da pesquisa e critérios para a aplicação da classificação de ‘patrimônio imaterial’”, e que “o deputado Edilson Moura (PT) [...] informou que apresentou há cerca de dois anos [2012] um projeto para disciplinar a escolha do que pode ou não ser considerado patrimônio imaterial [...]”, desconhecendo, portanto, que durante os quatro anos de seu partido no executivo estadual houve a criação dos dispositivos legais existentes que tratam especificamente desse ponto.
Se assim é, que se manifestem, sobre tal tema, a Alepa, a Secult, o Governador do Estado, e quem mais esteja incluído ou se sensibilize por tal discussão, afinal, feito da maneira que ainda se verifica, pouco ou quase nada significa a realização do registro, pois gera leis que servem mais aos desígnios de promoção política de seus proponentes. Além da marca de patrimônio cultural do Estado do Pará que imputam aos bens registrados, que outros benefícios efetivos lhes destinam? Nesses casos, pagar somente com o prestígio de carregar tal marca é pagar aos detentores (para usar a terminologia estatal) o que de mais baixo e de mais enganoso há – seja em termos culturais, seja em termos políticos.
A partir do que expus, vê-se que há uma homologia com o que ocorre no vizinho Amapá, e talvez por isso o projeto de Furlan trate do melody, ritmo musical de maior penetração popular e, portanto, passível de maior eficácia em gerar frutos políticos-eleitorais ao seu proponente, assim como há homologia no que ocorre no nível municipal em Belém, embora a eliminação da Festa da Chiquita do escopo da lei que reconhece o Círio de Nazaré como patrimônio cultural imaterial do município reflita, além dessa homologia, os preconceitos, a ignorância e a mediocridade do vereador Victor Cunha (PTB) e do prefeito Zenaldo Coutinho (PSDB) quando se trata do tema patrimônio cultural. Talvez, bem mais do que isso...

Fora, Temer!