Daqui a uma semana me mudo do Pará para Roraima. Naquele estado, certamente ingressarei e iniciarei outros projetos e atividades. Também é certo que terão algumas diferenças significativas com o que me tocou lidar até o momento, sobretudo pelas dissimilitudes dessa parte da Amazônia brasileira, pela proximidade que estabelecerei com o locus de minha atual pesquisa de doutorado - cujo primeiro trabalho em breve disponibilizo para vocês -, e pelo fato de que estarei tão próximo como nunca estive desde minha graduação de discussões mais constantes sobre a Administração. No entanto, tudo o que aprendi, discuti e experimentei até o momento terá muita importância na forma de pensar o que irei aprender, discutir e experimentar lá, e espero que me ajude nesse anseio de buscar no próprio seio da Administração críticas e práticas distintas, o que tenho chamado de Contra-Administração ou Administração herética (pretendo em breve desenvolver mais a discussão sobre essa forma de apreender e atuar no campo administrativo). Por isso, finalmente publico aqui no MC a minha dissertação de mestrado, na qual encontro o gérmen dessa discussão que pretendo desenvolver nos próximos anos.
Embora desde meu trabalho de conclusão da graduação, no qual escolhi um tema atípico para um administrador - a discussão das relações de poder em empresas através de um estudo de caso (case, no jargão gestionário) -, tenha demonstrado um interesse distinto da maioria de meus colegas de curso e formação, ainda nele, e por inúmeras razões, não me foi possível ocasionar uma ruptura ou questionamento maior e mais profundo ao utilitarismo acrítico hegemônico nessa ciência social aplicada. Saí da graduação, portanto, com esse profundo incômodo.
Assim, foi durante o mestrado que fiz o (necessário) movimento de afastar-me da Administração e buscar outras discussões, mantendo contato mais intenso especialmente com a Sociologia, a Microssociologia e a Antropologia. Por isso considero que é nesta dissertação que agora disponibilizo que encontro o gérmen das discussões e reflexões que me tomam atualmente e que pretendo aprofundá-las tanto no decorrer do doutorado que já me alcança pela metade e da atuação que terei em Roraima dentro do Instituto Federal daquele estado.
Iniciei o trabalho de elaboração da dissertação abaixo pensando em (1) afastar-me da relação profissional-investigativa quase exclusiva entre administrador e empresa stricto sensu, (2) reaproximar-me de uma Abaetetuba que esteve muito presente em minha infância, quando ia passar algumas férias na casa de minha avó paterna, a quem dedico in memoriam a dissertação, e, para atender o primeiro ponto, (3) discutir associativismo entre os artesãos e artesãs de miriti. Com o tempo, e especialmente através dos diálogos com meu orientador, Silvio Lima Figueiredo, percebi que o associativismo repete os mesmos erros racionais-utilitaristas da Administração e, mais que isso, é impositivo e desconhece as idiossincrasias daqueles atores sociais que enquadra, contribuindo com as tendências de estereotipação e reforço de estigmas, com a reificação de exclusões e marginalizações, e com a instauração de desenraizamentos e perdas de sentidos, o que pode desembocar em sérios conflitos desagregadores.
Desse modo, como alternativa a essa prática social técnico-racionalista e apologética, estabeleci uma outra perspectiva de abordagem, denominada como vida associativa, que, como vocês verão na dissertação e podem inferir a partir de outro texto já publicado aqui, é um processo longo e restituidor de sentidos, de forma que por ora penso que a vida associativa é uma das formas mais evidentes da Contra-Administração. Não me estenderei mais, deixando aos interessados o convite de que conheçam essa discussão por meio da leitura da dissertação, embora atualmente existam outros elementos e dimensões que naquele momento não pude abarcar, mas que venho tentando abordar e rever em novos trabalhos.
Por fim, reitero meus agradecimentos a todos os artesãos e artesãs de miriti, conforme consta na dissertação, e retifico-me de um lapso de tempo e memória que me fez deixar de fora dos agradecimentos minha prima Luana Alcântara e toda sua família, que me recebeu a cada ida à Abaetetuba e cuidou de mim de forma tão leve. Desculpe-me.
Em caso de citações, recomendo o uso da seguinte referência:
FERREIRA JÚNIOR, A. Entalhadores do efêmero: a vida associativa na criação dos Brinquedos de Miriti de Abaetetuba. 2015. 198f. Dissertação (Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento) - Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará, Belém, 2015.